10 de jun. de 2009

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Ele é Duro na Queda


Laércio Cosentino fez da Totvs a maior empresa de software da América Latina sem compaixão pela concorrência - azar de quem cruzou seu caminho


Revista EXAME -
Corria o ano de 1978 quando Laércio Cosentino, de 20 anos, estudante de engenharia eletrônica da Universidade de São Paulo, ingressou na Siga, empresa de serviços de processamento de dados. Desde o começo, Cosentino nunca foi daqueles estagiários que ficam condicionados às tarefas secundárias destinadas aos aprendizes. Inquieto, autodidata e ousado, criticava a forma de gestão da companhia - inchada e mal administrada, segundo ele - e dava sugestões de como poderia melhorá-la. Em troca, negociava promoções com a chefia. Se atingisse determinada meta, queria chegar a gerente ou diretor. O que poderia parecer arrogância ou excesso de autoconfiança foi entendido por Ernesto Haberkorn, presidente da Siga, como iniciativa e competência. Haberkorn entregou a Cosentino, meros dois anos depois de sua chegada à companhia, a tarefa de reestruturar a Siga. Foi então que, aos 22 anos, o jovem foi promovido a diretor e conduziu a primeira de muitas reorganizações que viriam em sua carreira: demitiu 50 funcionários. "Ele sempre pensou de forma fria e me dizia que eu precisava pensar com o coração da empresa", diz Haberkorn. Esse episódio do início da carreira de Cosentino resume a forma como ele passou a ser conhecido no mundo dos negócios. Laércio Cosentino é um trator. Por trás da fala mansa e do jeito tranqüilo existe uma pessoa obcecada por eficiência e incapaz de tolerar desculpas. Um dos dez mandamentos corporativos que o norteiam é ser binário. Assim como só existem o zero e o 1 para os computadores, no vocabulário de Cosentino só há espaço para "sim" ou "não". "Fez? Não fez? Quando vai fazer?", pergunta. Suas reuniões de trabalho não costumam passar de 20 minutos. Não se trata de intransigência, diz Cosentino, mas de objetividade. Foi graças a esse traço que ele se tornou sócio de Haberkorn em 1983, na criação da Microsiga, o embrião do que é hoje a Totvs, produtora de sistemas de gestão empresarial e maior empresa de software da América Latina. À objetividade Cosentino somou determinação e nos últimos quatro anos, com a compra de todos os seus principais concorrentes, tornou-se o nome mais importante do setor de tecnologia do país. Máquina de fusões É longa a lista de aquisições que levaram à composição atual da Totvs, uma empresa avaliada em cerca de 1,2 bilhão de reais na Bovespa, de acordo com o fechamento do mercado no dia 8 de dezembro. Igualmente longa é a lista de empreendedores que ficaram sem emprego depois de vender seus negócios para Cosentino. A primeira a ceder ao trator foi a Logocenter, uma companhia de Santa Catarina. Álvaro Junckes, então presidente da empresa, permaneceu na nova posição durante um ano. "Havia um acordo de cavalheiros de que eu ficaria. Mas em geral o que acontece nas fusões é a demissão para não haver duplicidade de funções. E quem se dá mal é quem foi comprado", afirma Junckes. Embora Junckes seja diplomático, pessoas que acompanharam a fusão afirmam que sua saída foi prematura e aconteceu por divergências com Cosentino. Em 2006, a situação se repetiu com os irmãos Rodrigo e Henrique Mascarenhas, da RM Sistemas. Discussões sobre remuneração levaram os irmãos Mascarenhas a pensar em processar a Totvs. A pendência foi resolvida em 2007 e, logo depois, ambos deixaram a empresa. Cosentino nega quaisquer pressões para afastar os líderes das empresas compradas, mas, em pequenos gestos, acaba reconhecendo a fama de implacável nas negociações. O mais claro deles veio justamente no dia do anúncio à imprensa da incorporação de sua principal concorrente, a Datasul, em julho. Cosentino entrou na sala carregando uma enorme bandeira branca, sinalizando o fim de uma queda-de-braço que durou nada menos do que nove anos. "Foram anos de ‘elogios’ de uma empresa para a outra, mas essa bandeira é necessária para mostrar que estamos em paz", disse, em tom irônico, na ocasião. Menos de cinco meses depois de oficializada a aquisição, Jorge Steffens, presidente da Datasul, também deixou a empresa. Muitos reagiram com surpresa à rápida partida de Steffens. Como Cosentino na Microsiga/Totvs, ele tinha passado toda a sua vida profissional na Datasul. Mas, segundo o fundador da empresa, Miguel Abuhab, o destino de seu pupilo já estava selado. "O Jorge sairia com ou sem a fusão", diz Abuhab. "A empresa precisava de um líder para contornar o fato de que as ações estavam meio debilitadas." Ou seja, até mesmo o maior concorrente queria um líder mais agressivo, com o perfil de Cosentino. A liderança firme de Cosentino tem sido decisiva para os resultados que a Totvs tem obtido na Bovespa. Embora tenha registrado uma queda de 37% nas ações ao longo dos últimos 12 meses, a Totvs não teve seus papéis desvalorizados em comparação ao valor fixado no dia em que estreou na bolsa, 32 reais. "Ele (Cosentino) é orientado a resultados, e os investidores avaliam, neste momento, como a empresa se comporta em relação às despesas", afirma Luciana Leocádio, analista-chefe da Ativa Corretora. A agressividade na consolidação das empresas de software de gestão do país também foi essencial para combater o avanço das gigantes internacionais, como a SAP, a Oracle e a Microsoft - todas elas interessadas no filão que mais cresce no competitivo mercado de ERPs. Apesar da dominância entre as grandes corporações internacionais, as estrangeiras enfrentam um concorrente duríssimo quando querem vender para as companhias de médio e pequeno porte daqui. A escalada da Tovs Em 2000, ao lado do ex-chefe Ernesto Haberkorn, hoje com 75 anos e líder do braço educacional da Totvs, Cosentino escreveu o livro Genoma Empresarial. A obra diz que, enquanto no ser humano não é possível extinguir características pré-determinadas pelos genes, nas empresas isso não só é possível como necessário. "Essa inclusão ou exclusão dos genes corporativos com base na evolução do mundo dos negócios é que cria um empresário de sucesso", afirma o livro. Segundo a teoria da evolução, os mais adaptados sobrevivem. Os genes empresariais mantidos por Cosentino - e aqueles que ele expurgou ao longo dos anos - foram suficientes não só para garantir a subsistência da Totvs, mas para criar um titã. Azar de quem cruzou seu caminho.

Fonte:http://portalexame.abril.com.br/revista/exame/edicoes/0933/tecnologia/ele-duro-queda-408279.html

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